A Estela Menezes com quem tive o prazer de
trabalhar há muito tempo e de poder continuar
trabalhando como se este ciclo nunca tivesse sido interrompido me mandou um e-mail genial sobre o aeroporto Santos Dumont.
Respondi contando as minhas lembranças sobre o aeroporto e a Estela me retornou contando as suas lembranças infantis com o seu avô que já se revelava diferente ao ser identificado como avô Barros.
Ele não parecia gostar de seu nome de batismo e adotou o sobrenome como nome e pelo que ela conta no seu texto anexo o velho Barros usou desta liberdade diante de todas as coisas que lhe aconteceram na vida e que podiam ser alteradas, bastando usar a imaginação..
Acho que você, como eu, vai ter pena de não ter convivido com o avô Barros...
A pergunta pode ser mais direta: quê tipo de avô você é? Acho que todos os que chegamos neste estágio temos muito a aprender com o Barros...
Se ganho na
feira feijão, rapadura, pra que trabalhar?
Já vim da aula
com elas atrás de mim. Em casa, do Google, saíram mais algumas: Pra que mentir?
Pra que fumar? Pra que brigar? Pra que sofrer? Pra que tanto lero lero?
E não é que fui
agarrada logo por essa De papo pro ar?
Agarrou e me
levou com ela até os tempos de eu pequena, no Maracanã, casa do meu avô que
adorava o disco, presente dos colegas de trabalho quando se aposentou.
E a vitrola
tocava e tocava Não quero outra vida, pescando no rio de Gereré... Mas o meu
avô, que nunca pescou na vida, gostava mesmo era de inventar coisas pra
encantar a gente.
Como naquela
vez em que, cheio de mistérios, convocou toda a criançada pra pegar moscas que
ele em seguida fez afogar numa vasilinha com água e, no meio da maior surpresa,
ressuscitou com um pouco de farinha de mandioca!
Depois, jurou
que foram as rezas e bênçãos que tinha aprendido no seminário, e deixou a gente
muito tempo pensando que tinha um avô bruxo ou santo, sei lá. (Só bem mais
tarde, por acaso, descobri a explicação científica pro “milagre”. Que talvez
até possa lhes revelar, pra vocês
encantarem também seus netos e sobrinhos.)
No dia a
dia, contava histórias do Boca Negra, o cachorro dele que fazia qualquer outro
bicho parecer tão bobinho e sem graça... Ou ficava ensinando a gente a rimar e
metrificar, porque dizia sempre que ainda ia ter um neto – ou neta – poeta. E
quando ventava? Não sossegava enquanto não convencia alguém de que aquelas
árvores enormes do morro em frente eram gigantes curvados, cansados de tanta
subida...
Outra vez,
fui com meus pais e irmãos morar fora do Brasil. No meio da choradeira das
despedidas, vovô nos prometeu solenemente que cuidaria muito bem da nossa
cachorrinha, mandaria sempre notícias dela.
Algum tempo depois, eis que
recebemos um envelope gordo, cheio de fotos da Tiroleza amamentando um monte de
gatinhos que, segundo o vovô, ela havia acabado de ganhar! (Até hoje tenho aquelas
fotos. Só a magia é que eu não sei aonde foi parar...)
Ah! Não era
nada fácil ter um avô assim... Todas as crianças tinham avôs que se chamavam
Paulo, João, Felício. Mas o nosso, a gente era obrigado a chamar de Vovô
Barros, porque ele não gostava do nome dele que era Benedito e a gente morria
de rir.
Quanta saudade!
Pra que fui lembrar, meu Deus, se não sei tocar viola e nem tenho papo pra
virar pro ar?
“Quando no
terreiro
Faz noite de
luar
E
vem a saudade
Me
atormentar
Eu
me vingo dela
Tocando
viola
De
papo pro ar”
Nota
do Autor: Pra quem não conhece e também pra quem conhece, recomendo googlar a
música De Papo pro Ar, e se deixar seduzir pelo Ney Matogrosso.
Estela Menezes . abril 2013.